Eu confesso: assim como todo ser humano eu também possuo anseios, desejos, vontades e principalmente ingenuidade frente aos fatos da vida nesse planeta. O principal fator de diferenciação para aplicação em diferentes personalidades é a maneira de interpretar esses fatos. Muitas vezes o resultado é um impulso que não podemos evitar quando nos deparamos com certos acasos. Por exemplo, se eu vejo um doce em uma prateleira de panificadora, provavelmente eu terei o impulso de pelo menos pensar que aquele doce é bom, saboroso e que poderia estar em minhas mãos ao invés da prateleira. De fato o exemplo é simples, mas traduz na prática o que costumamos chamar de “desejo”.
Mas vocês sabem qual é o maior desejo da
sociedade contemporânea? Se sua resposta for dinheiro, está quase certo, porém
há algo bem mais atrativo e que é garantido toda semana: a noite de
sexta-feira. Posso estar generalizando, e realmente estou, mas pelo menos em
minha realidade não há algo mais prazeroso do que a sexta à noite. Por que
vocês acham que a maioria dos shows, eventos, festas e outras ocasiões são
marcados para acontecerem na véspera de sábado? Claro que não são todas as
pessoas que consideram isso como diversão absoluta, entretanto não podemos
esquecer que em nossos tempos e em toda a história da humanidade, o desejo faz
parte do caráter humano, assim como a satisfação da carne.
Durante a semana acabamos por querer apenas
três coisas: descansar, descansar e descansar, mas quando chega a sexta-feira,
queremos descarregar todo o estresse da semana em apenas uma noite para que
possamos ter mais motivos para um descanso durante o sábado e o domino. Isso é
compreensível, mas à medida que o homem descobria esse lado “farreador”, mais
formas de se aproveitar a sexta à noite foram surgindo. Desde a bebedeira de
vinho em homenagem a Baco, até o vira-vira da garrafa de Jack Daniels nas casas
de festas.
Hoje temos o produto da criatividade do homem
para esse tipo de ocasião, e esse tipo de invenção não para de crescer em
números e categorias. Podemos citar as famosas “raves”, abarrotadas de pessoas
sedentas por diversão e que pagam qualquer preço para obter satisfação. Música
eletrônica de todas as vertentes e nomes, DJ’s que deslizam os dedos sobre os
pick-ups durante horas de muita farra, bebedeira e beijo na boca... Sexo,
drogas também entram na gandaia.
Realmente para alguns isso têm alguma graça,
mas algo interessante a ser observado nos diferentes tipos de festa do gênero
“Sexta à noite” são as características que nos permitem classificá-las com tão
pouco tempo de observação. Sei que muita gente está cansada de ouvir a respeito
de desigualdade social no Brasil, mas infelizmente esse é um assunto que não
sairá da pauta da opinião pública tão cedo. O mesmo vale para a distribuição de
renda, mas se estamos interessados em fugir das estatísticas e olharmos um
pouco para prática, não precisamos dar o exemplo óbvio de que ao mesmo tempo em
que uma pessoa passa fome há outra comendo caviar, basta olhar para as festas
de sexta à noite.
Um rapaz de camisa branca e gola rulê estava
tranquilamente a caminho de uma festa marcada para acontecer às 22:00 horas de
sexta-feira. De calça jeans azul e tênis de mola, o rapaz ainda trazia uma
garota, no intuito de compartilhar esse momento de diversão que esperava ter. O
local da festa fica no centro da cidade, possui um espaço muito próprio para
comportar muitas pessoas. Antes de falar com o segurança para entrar, decidiu
comprar uma latinha de cerveja para se e para a namorada. Pagou, recebeu o
troco em moedas e puxou o anel da lata para começar a beber. Um gole e já
estava do outro lado da pista, de frente para o segurança e ansioso pela noite,
afinal aquela prometia.
O segurança, homem alto e com a barba um
pouco crescida, olhou o rapaz dos pés a cabeça e fez o mesmo com a garota que o
acompanhava. Ele pegou um caderno e folheou as páginas de maneira bastante
relaxada, o que poderia passar batido devido a quantidade de pessoas que
passaram por ele naquela noite. Depois de ler por um bom tempo uma pagina do
caderno, fechou-o e por fim respondeu ao rapaz:
_Me desculpe, mas seu nome não está na lista.
O rapaz ficou indignado e extremamente
constrangido. Como alguém poderia frustrar o seu objetivo de se divertir sexta
à noite? Por que ele não poderá curtir o som da música eletrônica que estava
rolando na casa de festas, assim como todas aquelas pessoas que estavam lá?
_Mas eu paguei por esse ingresso! Você tem
ideia de quanto eu paguei? Do quanto foi caro?
O segurança parecia estar evitando falar
alguma coisa, mas preferiu repetir:
_Me desculpe, mas sem nome na lista não
entra.
O rapaz resolveu apelar. Ele jogou sua lata
de cerveja no rosto do segurança com tanta violência que provocou uma ferida
bem feia na região das narinas. Parecia ter quebrado. O segurança resolveu
revidar, ensanguentado e cheirando a cerveja. Agarrou o rapaz revoltado pelos
braços e logo o deixou de joelhos e ameaçando quebrar seus membros superiores,
e ainda dizia:
_Agora você vai entrar na festa da delegacia!
Seu.......!
E aí, ficou curioso em saber qual é a palavra
nos tracinhos? Eu vou revelar qual é, mas antes vamos para outro lugar na mesma
cidade.
A música também tocava, assim como a galera
não economizava energia para dançar. Outro rapaz, de bermuda branca, tênis de
mola, mas sem camisa e com óculos escuros apoiado na testa. Ele caminhou até o
local onde a festa estava acontecendo, sem ao menos um segurança para conferir
seu nome na lista. Sem vergonha alguma, chamou uma garota para dançar. A garota
estava bem provocante, de shorts curtos e uma vestimenta que não sei se dá para
chamar de sutiã, pois era a única peça de roupa que usava para “tampar” os
seios.
O rapaz parecia não conhecer a garota antes
de chamá-la para dançar, mas em poucos minutos de dança a relação era
exageradamente íntima, ou melhor, tão íntima que chegava a ser obscena. Ela
estava de costas para o rapaz, dobrou seu ventre de modo a deixar o corpo sustentado
pelas pernas abertas e o tronco na horizontal. Seu quadril se movia na batida
do som e o rapaz mais fazia referência ao ato sexual do que propriamente dançava.
Em questão de segundos, outro rapaz surgiu do
nada e disparou quatro tiros no peito do rapaz com a garota de shortinho. Ela correu
desesperada para fugir do atirador furioso e fora de si. A multidão que estava
na festa também se desesperou, afinal a coisa mais fácil de acontecer seria
alguém levar uma bala perdida, entretanto um grupo de pessoas tomou a perigosa
atitude de segurar o criminoso portando um revólver calibre 38. Conseguiram segurar
o rapaz até a chegada da polícia, a qual procedeu com as medidas cabíveis, como
deixar o criminoso sob observação, isolar a cena do crime, recolher testemunhas
e encaminhar o corpo do rapaz de bermuda branca para o IML.
Depois de uma boa viagem até a delegacia, o
assassino foi convidado a conversar com o delegado, mas antes devia esperar
outra conversa terminar. Ouve-se um burburinho na sala do delegado, seguido de
muitos xingamentos e intervenções de agentes para conter os ânimos no ambiente.
Após alguns minutos de confusão, a porta da sala se abre e de lá saiu um homem
alto, com a barba um pouco crescida, de terno e gravata e o nariz quebrado. Ele
saiu da delegacia e logo o assassino teve a chance de conversar com o delegado,
mas não foi bem assim. Nem mesmo disse uma palavra ao doutor em direito e já
foi mandado para a cela de prisão, junto a um rapaz vestido com uma camisa
branca de gola rulê, calça jeans e tênis de mola.
O rapaz de camisa gola rulê perguntou ao
companheiro de cela:
_E aí neguinho? Tá aqui por quê?
_Matei um filho da puta que tava mexendo com
a minha mina lá no fluxo. E tu?
Ele deu um suspiro e respondeu:
_Tô aqui porque eu sou preto e não pude
curtir minha sexta-feira à noite com aqueles branquelos.

Nenhum comentário:
Postar um comentário